Artigo – O que escondem nos 30 anos do Plano Real

Marcos de Oliveira*

Em setembro de 1994, o então ministro da Fazenda Rubens Ricupero, enquanto aguardava ser entrevistado pela TV sobre o Plano Real, disse uma frase – sem saber que o programa já podia ser captado pelas antenas parabólicas – que o marcaria: “Eu não tenho escrúpulos; o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde.” Apesar de vinculada ao diplomata, a sentença representa boa parte do pacote econômico e cai como uma luva na cobertura midiática dos 30 anos do Plano Real.

Poucos órgãos de imprensa levantaram questões obscuras sobre o pacote. Uma delas, neste Monitor Mercantil, foi uma entrevista com Roberto Luiz Troster, ex-economista-chefe da Febraban, sobre os entulhos do período hiperinflacionário que permaneceram; outra, uma reportagem num site de informações financeiras, perguntava quanto valeriam hoje R$ 1 mil, dependendo da aplicação, nestes 30 anos do Plano Real.

Em dólar, seriam hoje R$ 5.875,43, perdendo para a inflação: corrigidos pelo IPCA, os R$ 1 mil valeriam hoje R$ 7.585,09; na poupança, R$ 17.784,31, um razoável ganho. Se optasse por risco, na Bolsa de Valores, o investidor teria R$ 29.587,94. Nada se compara ao ganho em aplicar em renda fixa, com risco quase zero: com a taxa do CDI (paga pelos bancos aos seus clientes mais abastados), os R$ 1 mil pulariam para R$ R$ 76.464,62 – 10x o valor corrigido pela inflação. Estão por trás dessa distorção os “entulhos do período hiperinflacionário” de que fala Troster.

Os efeitos sobre a economia real (sem trocadilho) são perversos: a taxa de investimento (produtivo, a formação bruta de capital fixo) definha ano após ano, e fica difícil ser diferente: que negócio (lícito) consegue ganhar de rendimento financeiro? Haja TIR (Taxa Interna de Retorno)… Somente no setor ilícito, como drogas ou jogo do tigrinho (para quem banca), para se ter retorno assim.

O efeito também se dá sobre a inflação, que, na comemoração dos 30 anos do Plano Real, garantiu-se ter sido debelada. Para obter retornos em negócios que correm risco, como reza o capitalismo, os preços dos produtos acabam inflados; ou então tem-se uma produção anêmica, alimentando a inflação sempre que o Brasil ousa crescer.

Quem tem investimentos financeiros vive como na época da hiperinflação quando se trata dos ganhos. O ex-banqueiro Eduardo Moreira, em vídeo que viralizou, mostra o extrato de um jovem que pegou um singelo empréstimo de R$ 20 no Santander. O papel do banco revela que o CET (Custo Efetivo Total da operação, que inclui juros, tributos, encargos tarifas) foi de 861.707,22%. Isto mesmo, não é erro de digitação: mais de 800 mil por cento. Ao ano. CDI é para os reles mortais.

(Comunicação AEPET)

Compartilhe essa notícia

Facebook
Twitter
WhatsApp

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *