A doença é causada por um fungo que foi detectado pela primeira vez no país.
Com base em análises biológicas e moleculares, a Embrapa Amapá e a Embrapa Mandioca e Fruticultura confirmaram ao Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) o primeiro registro da presença do fungo Ceratobasidium theobromae (também conhecido como Rhizoctonia theobromae), causador da vassoura-de-bruxa da mandioca, no Brasil. O patógeno foi confirmado por um relatório do MAPA por meio da análise da identificação da espécie por uma equipe do ministério.
A doença foi encontrada em plantações de mandioca nas terras indígenas de Oiapoque, município do estado do Amapá, localizado na divisa com a Guiana Francesa. A presença de Ceratobasidium theobromae representa risco de redução significativa na produtividade das plantas de mandioca afetadas. O fungo não foi detectado em outros hospedeiros no Brasil até o momento.
“Vassoura de bruxa” é assim chamada porque deixa os galhos da planta secos e deformados, com nanismo e proliferação de brotos fracos e finos dos caules, fazendo com que pareça uma vassoura seca. À medida que a doença evolui, clorose, murcha e secagem das folhas ocorrem comumente e, eventualmente, morte apical e descendente da planta.
Ceratobasidium theobromae pode ser disperso por meio de material vegetal infectado, ferramentas de poda e solo e água contaminados. “A movimentação de plantas e produtos agrícolas entre regiões pode facilitar a disseminação do patógeno, aumentando o risco de infecção em novas áreas”, alerta a Nota Técnica da Embrapa ( leia o arquivo completo em português aqui ).
Pesquisadores do Centro Francês de Pesquisa Agrícola para o Desenvolvimento Internacional (CIRAD/França) e do Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT/Colômbia) coletaram e isolaram Ceratobasidium theobromae em áreas afetadas com sintomas semelhantes na Guiana Francesa, perto da fronteira com o Brasil e o Suriname.
A Embrapa reforça que a detecção de Ceratobasidium theobromae no Brasil requer cooperação imediata entre agentes de assistência técnica, órgãos estaduais de defesa vegetal, pesquisadores, produtores rurais e autoridades governamentais, pois é fundamental implementar medidas efetivas de contenção, manejo e controle para garantir a segurança e a sustentabilidade da produção agrícola. A descoberta da Embrapa pode contribuir para o progresso científico nas pesquisas para o melhoramento da mandioca e para as medidas recomendadas para o controle da doença.
Recomendações para reduzir o impacto da doença1. Monitoramento e vigilância intensificados das áreas cultivadas para identificação precoce de sintomas. 1.1. Protocolo de detecção precoce do patógeno via PCR e/ou via sequenciamento HTS para dar suporte às atividades de monitoramento e vigilância. 1.2. Acreditação de laboratórios para diagnosticar e indexar patógenos importantes da mandioca. 2. Quarentena: Implementação de medidas de quarentena para restringir a movimentação de material vegetal de áreas afetadas. 3. Estacas saudáveis: Utilização de estacas de mandioca comprovadamente saudáveis, que foram produzidas em regiões sem a doença ou em condições que não permitem o crescimento do patógeno (por exemplo, câmaras térmicas, viveiros e estufas). 4. Tratamento Químico: Utilização de fungicidas específicos para controlar a disseminação do patógeno, em conformidade com as regulamentações locais. 5. Práticas de cultivo: remoção e queima de plantas doentes para reduzir a inoculação em áreas afetadas e diminuir a incidência de novas plantas infectadas. 6. Assepsia/Sanitização de ferramentas utilizadas para destruir plantas que apresentam sinais da doença. Uma lavagem com água e detergente é seguida por uma sanitização com uma solução de hipoclorito de sódio a 1,25%. 7. Ensacar e lavar imediatamente roupas, calçados e chapéus usados em visitas a áreas afetadas pela doença, para evitar a disseminação de esporos para outras regiões do país. 8. Publicações, vídeos e cartazes para conscientizar sobre os sinais da doença e os meios de transmissão. |
Histórico para coleta de material infectado
Em março de 2023, uma equipe da Embrapa Amapá participou da 29ª Assembleia dos Povos e Organizações Indígenas do Oiapoque para Avaliação e Planejamento (APIO), evento realizado pelo Conselho de Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque (CCPIO). A instituição de pesquisa foi incumbida de avaliar e planejar atividades dentro de seu escopo de atribuições para mitigar a ocorrência de doenças da mandioca. Na semana seguinte, uma equipe identificou in loco sinais de vassoura-de-bruxa da mandioca nas aldeias indígenas Ahumãm, Anawerá, Tuluhi e Tukay.
Posteriormente, os mesmos sinais foram detectados nas aldeias Kuahí, Ywawká, Karibuen, Kuai Kuai, Ariramba, Galibi, Lençol, Manga, Zacarias e Japiim. Conforme Nota Técnica da Embrapa Amapá, por ocasião da detecção dos primeiros sinais da doença, hastes de mandioca infectadas foram transportadas para o Laboratório de Proteção Vegetal da Embrapa Amapá para isolamento do provável agente etiológico em condições laboratoriais.
Análise molecular do fungo
À medida que os sintomas da doença evoluíram nas plantações indígenas de mandioca no Oiapoque, novas amostras de plantas infectadas foram analisadas no Laboratório de Fitopatologia da Embrapa Mandioca e Fruticultura, na Bahia, para o diagnóstico molecular do agente causal do surto no Amapá.
As amostras foram então liofilizadas e preservadas a -80 °C para análise de sequenciamento profundo em sequenciadores de alto rendimento nas plataformas Illumina e Nanopore, em parceria com a Coleção Alemã de Microrganismos e Culturas Celulares ( Deutsche Sammlung von Mikroorganismen und Zellkulturen – DSMZ), na Alemanha.
Em seguida, foi feito o sequenciamento de amostras coletadas com base em diferentes tecidos (folhas, talos e caules) e a comparação com patógenos semelhantes, incluindo os endêmicos, os relevantes para a cultura e outros que não haviam sido relatados no Brasil.
A técnica detectou um grande conjunto de patógenos e organismos endofíticos associados à cultura, mas que nunca haviam sido relatados em associação com os sinais observados no local, com exceção do Ceratobasidium theobromae, um fungo que nunca havia sido relatado nas Américas.