A Embrapa e parceiros avançam na definição das diretrizes técnicas para validar a metodologia de certificação de soja de baixo carbono. Foi publicada a primeira versão do documento Diretrizes técnicas para certificação Soja Baixo Carbono . O documento contém as premissas para atestar a mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEE) em sistemas de produção agrícola candidatos do Brasil. Essas premissas estão sendo utilizadas para subsidiar a coleta de dados em mais de 60 áreas agrícolas em cinco macrorregiões agrícolas, durante duas safras (2023/2024 e 2024/2025).
“A publicação das diretrizes de certificação nesta etapa é fundamental para validarmos cientificamente a metodologia de quantificação que está sendo desenvolvida pela Embrapa”, explica o coordenador do Comitê Gestor do Programa Soja Baixo Carbono ( PSBC ), Henrique Debiasi , pesquisador da Embrapa Soja (PR).
Debiasi enfatiza que essa é uma das maiores iniciativas do setor brasileiro. Ela visa agregar valor à soja produzida em sistemas específicos para a redução das emissões de GEE. O Programa estima que, ao se adotar as tecnologias sustentáveis descritas na publicação, o potencial de redução das emissões nos sistemas de produção com soja pode ser de, aproximadamente, 30%.
De acordo com o pesquisador, o escopo do PSBC prevê a comparação dos sistemas de produção típicos (culturas agrícolas utilizadas e as práticas de produção exigidas) com as áreas candidatas a receber o selo Soja Baixo Carbono (SBC), ou seja, que adotam soluções mitigadoras. “O objetivo é tornar tangíveis aspectos qualitativos e quantitativos do grão, a partir de tecnologias e práticas agrícolas que reduzem a intensidade de emissão de GEE”, explica. “O conceito está pautado na mensuração dos benefícios e na certificação voluntária das práticas de produção que comprovadamente resultam em menor emissão de GEE”, acrescenta.
Todas as ações de pesquisa, desenvolvimento e inovação que visam estabelecer, validar e operacionalizar o protocolo de certificação SBC são agrupadas e coordenadas dentro do PSBC. A construção metodológica é coordenada pela Embrapa Soja, com a participação de especialistas de diversas unidades da Embrapa, agentes da cadeia produtiva da soja e representantes das empresas parceiras: Bayer , Bunge , Cargill , Coamo , Cocamar , GDM e UPL .
A publicação das Diretrizes Técnicas para Certificação Soja Baixo Carbono – a primeira aproximação é o primeiro passo para validação da metodologia que está sendo desenvolvida pela Embrapa. Ao adotar boas práticas agrícolas e seguir os requisitos preconizados pelo PSBC, o produtor rural submeterá seu sistema de produção à aferição da certificação credenciada. Se conseguir, o selo SBC acompanhará a comercialização da soja, um diferencial competitivo valorizado no mercado.
Mais informações no hotsite: www.sojabaixocarbono.com.br .
Diretrizes técnicasA estruturação do Programa está pautada em duas diretrizes técnicas: adequação da propriedade rural e adequação do sistema de produção. “Cada diretora possui critérios de elegibilidade, que devem ser atendidos para que o candidato da área possa receber o selo SBC. Esse atendimento será mensurado por indicadores de alcance”, diz Debiasi (detalhes na tabela de estruturação da certificação da marca-conceito SBC). O pesquisador Marco Antonio Nogueira explica que os critérios de elegibilidade para a adequação do imóvel rural estão relacionados às questões de legalização (imóvel rural sem autuações ou embargos ambientais, proprietário sem relatórios por trabalho infantil ou análogo à escravidão, imóvel rural com Cadastro Ambiental Rural – CAR ativo e sem pendências trabalhistas); eliminação de queimadas deliberadas e atendimento às normatizações, a exemplo do respeito ao vazio sanitário (medida de manejo da ferrugem asiática da soja) e calendário ao de semeadura da oleaginosa. Quanto à adequação do sistema de produção, Nogueira conta que os critérios de elegibilidade estão centrados na adoção de práticas agrícolas obrigatórias e das recomendáveis, além da melhoria do balanço de carbono na área de produção. “Criamos o Índice de Adoção de Práticas Agrícolas Sustentáveis (Iapas), baseado em indicadores de boas práticas agrícolas que contribuem para a mitigação de GEE, complementar às Práticas Agrícolas Obrigatórias. O Iapas pode assumir valores entre 0 e 10 e reflete o grau de adoção de práticas recomendáveis”, explica o pesquisador. “Para receber o selo SBC, o Iapas deve atingir um valor mínimo de 7 e, ao longo do tempo, apresentar tendência de aumento para indicar a melhoria contínua do sistema”, complementa.
Práticas a serem cumpridasDe acordo com o pesquisador, as práticas obrigatórias envolvem a adoção plena do Sistema Plantio Direto ( SPD ), boas recomendações de coinoculação, adubação e correção do solo, assim como o uso de agrotóxicos técnicos prescritos. Também há algumas práticas complementares que devem ser observadas para o atingimento do valor mínimo do Iapas. São elas: Zoneamento Agrícola de Risco Climático ( Zarc ); Manejo Integrado de Diretrizes ( MIP ); Manejo integrado de doenças ( MID ) e Manejo integrado de plantas ( MIPD ); práticas conservacionistas de manejo do solo e do sistema, complementares ao SPD; uso de sementes certificadas; integração labora-pecuária-floresta; adoção de ferramentas digitais e georreferenciadas para o manejo sítio-específico; e realização de análise física e biológica para monitorar a qualidade do solo. “São técnicas que os produtores podem utilizar conforme as possibilidades de suas condições locais, mas, apesar de não serem compulsórias, quanto maior e melhor para a adoção dessas práticas, serão os melhores resultados no cálculo das emissões evitadas de carbono na atmosfera e na sua fixação ao solo por tonelada de grão produzido”, diz Nogueira. Em relação à melhoria do Balanço das Emissões, são indicadores de alcance: a Intensidade das Emissões de GEE (IEGEE) do sistema de produção candidato inferior ao sistema típico de produção da região, e a isenção das emissões relativas à Mudança de Uso da Terra. “Para estar apta ao selo SBC, a área candidata deve, além de atender aos critérios de elegibilidade qualitativos (práticas orgânicas obrigatórias e complementares), apresentar estoques de carbono orgânico total do solo (COT) superiores e valores de IEGEE inferiores ao sistema de produção típico, comprovando que o sistema candidato ao selo de fato mitiga as emissões de GEE, em relação ao sistema típico da região”, detalha a pesquisadora da Embrapa Roberta Carnevalli . |
Próximos passos
O foco do Programa SBC passa agora pela instituição e validar o protocolo de certificação. “O protocolo será composto, em essência, por um memorial descritivo, por uma lista de verificação de Conformidades e anexos que descrevem as métricas e os critérios envolvidos na atribuição do selo SBC. Em resumo, as diretrizes indicam o que medir e avaliar, ao passo que o protocolo descreve o como fazer”, aponta Roberta Carnevalli.
A partir da safra 2023-2024, o protocolo passou a ser validado em mais de 60 áreas agrícolas (unidades-piloto), distribuídas em todas as regiões produtoras de soja no território brasileiro. As unidades-piloto foram indicadas pelas empresas que apoiam o PSBC, que priorizaram áreas que adotam um sistema de produção de soja com potencial para a obtenção do selo SBC já no curto-prazo.
Essa etapa visa também escalar a iniciativa, de forma a identificar sistemas de produção aptos à certificação, já por ocasião do lançamento do protocolo para o mercado, previsto para meados de 2026. “O processo de validação envolve ainda uma discussão do protocolo com o setor Produtiva, com organizações internacionais e com representantes do mercado do grão, para que a metodologia proposta reflita a realidade do produtor brasileiro e, ao mesmo tempo, seja aceitação e respeito internacionalmente”, afirma a pesquisadora.
Um protocolo adequado às condições brasileiras
“O grande diferencial do PSBC é que está fundamentado nas condições edafoclimáticas das diferentes macrorregiões sojícolas do País e o cálculo da intensidade de emissão de GEE adota parâmetros condicionados aos ecossistemas nacionais e às práticas agrícolas adotadas. Isso evita o surgimento de padrões e regulamentações adotadas, cujas premissas são fundamentadas em regiões com uma realidade diferente à observada para o Brasil”, destaca o pesquisador Marcelo Hirakuri .
Um outro aspecto que está sendo planejado é a criação de protocolos de certificação de “baixo carbono” para outras culturas e atividades que compõem o sistema de produção de soja, prolongados por unidades da Embrapa.
PSBC e as práticas sustentáveis
O selo Soja Baixo Carbono baseia-se na metodologia MRV (mensurável, reportável e verificável). “A sua adoção é totalmente voluntária e poderá ser utilizada por produtores que contribuirão para colaborar em iniciativas verdes que possam ser qualitativas e quantitativamente comprovadas”, declara o chefe-geral da Embrapa Soja, Alexandre Nepomuceno .
Segundo ele, o PSBC pretende considerar a soja oriunda de iniciativas ambientalmente sustentáveis e, consequentemente, abrir possibilidades de compensações financeiras, seja agregando valor ao produto comercializado e até mesmo a obtenção de juros mais baixos e prêmios mais interessantes em seguros agrícolas, iniciativas já operantes sem mercado.
“Os padrões de sustentabilidade, conhecidos como normas voluntárias de sustentabilidade (NVS), têm ampliado sua importância em todo o mundo, especialmente no setor agropecuário, tornando-se um importante elemento de agregação de valor e de diferenciação da agricultura brasileira”, afirma o chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Soja, Carina Rufino . “Com o PSBC, o Brasil se posicionará fortemente no agronegócio mundial, com uma iniciativa de coalização setorial que mede e demonstra com critérios científicos sua contribuição para uma agricultura mais sustentável e adaptada para enfrentar as mudanças climáticas”, destaca.